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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

“Falta informação sobre o impacto da nanotecnologia na saúde humana”




07/11/2011 | 00:09 | BRENO BALDRATI

"Falta informação sobre o impacto da nanotecnologia na saúde humana”
Alexandre Quaresma, pesquisador

Autor do livro Nanotecnologias: Zênite ou Nadir?, o pesquisador Alexandre Quaresma afirma que ainda há pouca in­­formação sobre o efeito da na­­notecno­logia na saúde humana e de outros seres vivos – ape­­sar de as nanopartículas estarem presentes em diversos produtos disponíveis no mercado. 

Divulgação / “Al­­guns estudos mostram que, devido ao diminutíssimo tamanho dessas partículas, essas substâncias podem não respeitar as barreiras naturais de proteção dos organismos (pele, tecidos, sangue), indo se alojar diretamente em órgãos importantes como cérebro, pulmões, rins”, afirma ele. Nesta entrevista, realizada por meio de uma troca de e-mails, ele discute as áreas que melhor estão utilizando a nanotecnologia, o impacto de seu uso para o desenvolvimento dos países e como o Brasil ainda carece de uma política para usar essa ferramenta de forma correta. 
Quaresma estará em Curitiba nesta semana para participar do IV Simpósio Nacional de Tecnologia e So­­ciedade, na Universidade Fede­­ral Tec­nológica do Paraná (UFTPR), entre os dias 9 e 11 de novembro.

Que áreas vêm utilizando a nanotecnologia da forma mais eficaz?
As nanotecnologias agregam aos produtos e técnicas justamente aquilo que mais se cultua no mercado capitalista pós-moderno: a eficiência e o lucro. Em termos globais, sua pesquisa, desenvolvimento e utilização, lamentavelmente, são li­­derados pelo setor bélico e ar­­mamentista, ou seja, pela in­­dús­­tria da guerra dos países ditos mais desenvolvidos. Logo atrás vêm os novos materiais com novas propriedades, a medicina com novas técnicas, os fármacos com novas e mais reativas substâncias e drogas, os cosméticos de ação mais profunda, tintas, embalagens, alimentos, utensílios, materiais de construção, eletro-eletrônicos... e a lista segue imensa.
Reprodução /
Qual é a sua maior preocupação com o uso da nanotecnologia?
A maior preocupação
da rede a qual eu faço parte (Renanosoma - Rede de Pesquisa em Nanotec­no­­lo­­gia, Sociedade e Meio Am­­biente), que organiza seminários internacionais sobre o as­­sunto nanotecnologias (e já estamos indo para o IX, sendo que o próximo será aí em Curi­­tiba, sob a coordenação local da professora Noela Invernizzi, da Faculdade de Educação da UFPR, e coordenação nacional do professor Paulo Roberto Mar­­tins, da USP/IPT), é a questão da toxicidade destas nanopartículas para o ser humano e demais seres vivos, já que não existem estudos conclusivos quanto a isso, enquanto que os produtos e serviços que trazem nanotecnologias já estão no mercado sendo consumidos li­­vremente. Em seguida há também questões sobre possíveis impactos negativos no meio ambiente, nas cadeias produtivas, além dos próprios trabalhadores que podem estar ex­­postos a essas perigosas nanosubstâncias sem nem mesmo saberem. Alguns estudos mostram que, devido ao diminutíssimo tamanho dessas partículas, essas substâncias podem não respeitar as barreiras naturais de proteção dos organismos (pele, tecidos, sangue), in­­do se alojar diretamente em órgãos importantes como cérebro, pulmões, rins etc. Vale no­­tar, a propósito disso, que as seguradoras internacionais ainda não fazem seguros de projetos de nanotecnologias. Esses e muitos outros temas serão tratados no próximo se­­minário, onde os curitibanos poderão saber mais sobre essa escala nanoscópica da matéria e da vida.
Qual é a sua maior preocupação com o uso da nanotecnologia?
Muitas pessoas já advertiram para a manipulação de nanopartículas por exércitos ou gru­­pos terroristas. Você teme esse cenário? Quão acessível é a tecnologia hoje para um gru­­po terrorista, por exemplo?
Esse medo da população é bastante compreensível, já que os grupos que fomentam este de­­senvolvimento não têm apresentado nenhum compromisso com as populações e coletividades humanas, priorizando apenas os resultados financeiros do consumo das mesmas (na­­notecnologias). Não estão empreendendo as pesquisas sobre os impactos e riscos, ha­­vendo também desdobramentos geopolíticos complexos de concentração de riquezas, de­­vido à reconfiguração de poder que as nano possam propiciar nas cadeias industriais. Afinal, quem detém a melhor e mais avançada tecnologia, detém, contigua e consequentemente, o maior poder físico, financeiro, político e até bélico em termos planetários. Quanto ao terrorismo, como ato radical extremo usando nanotecnologias, tudo pode acontecer. Não há como prever se um grupo radical vai usar nanotubos de carbono para fazer um atentado em algum ponto do planeta. Se a intenção por trás das ações for nefasta, nefastas também serão as suas consequências sociais. Eu, pessoalmente, es­­pero que não ocorra tão cedo um atentado com nanopartículas ou nanosubstâncias
E o “Gray Goo Scenario”, a ideia de uma reação em cadeia na imagem de uma gosma cinza, em que robôs nanoscópicos cobririam a terra em questão de semanas. É ficção científica ou é um cenário possível?
Hoje, ainda é ficção, mas amanhã... O Eric Drexller [cientista americano que discutiu o assunto no livro Engines of Creation], quando disse isso, estava se referindo às pesquisas com substâncias híbridas, meio orgânicas, meio sintéticas e, o mais importante, autopoiéticas, ou seja, autoreplicáveis sem a intervenção humana. O temor é que estes nanodanadinhos inteligentes para burro e determinados possam aumentar de quantidade e fu­­gir do controle, criando um pro­­blema maior do que o que pretendia ajudar a sanar (por exemplo: nanosubstâncias hí­­bridas para sequestrar vazamentos de petróleo em mar aberto).
Como o Brasil tem usado a na­­notecnologia? Há alguma área específica em que o país se destaca?
O Brasil, apesar de estar atrás dos demais países por razões óbvias relativas à disponibilidade de recursos e por não ter um plano articulado (política públi­ca) de desenvolvimento tecnológico, tem bons exemplos de sucesso.
Um que eu gostaria de citar é o do professor [An­­tônio Claudio] Tedesco, membro da nossa rede, que desenvolveu uma terapia com luzes e gel nanoengenheirado para o combate do câncer de pe­­le, com índices de cura bastante expressivos. A técnica consiste no seguinte: aplica-se o gel, em seguida aplica-se raios de luzes específicas, de maneira que se pode calterizar e matar a célula doente sem afetar a célula saudável ao lado, pois o gel é programado para aderir e reagir apenas em contato com as células cancerosas. Nós da Renano­soma não compreendemos porque isso não é produzido no Bra­­sil em escala industrial. O professor Tedesco há tempos peregrina nos corredores do Ministério da Saúde com seu fantástico projeto, e os responsáveis, que deveriam zelar pela implementação de tais ações tão reparadoras e edificantes para os que sofrem com tal ma­­zela, não tomam as devidas providências, nem abrem as devidas portas de possibilidade para a viabilização do referido projeto. Trata-se apenas de um exemplo de sucesso, mas existem vá­­rios mais que eu poderia citar.
Na área de novos materiais, por exemplo, há descobertas novas todos os dias, e o Brasil está trabalhando.

Em minha percepção,
nós brasileiros deveríamos vincular nanotecnologias com tecnologias sociais, por exemplo, valorizando culturas, regiões, seguimentos sociais, meio ambiente, recursos naturais, desenvolvimento sustentável e assim por diante. As nanotecnologias, se bem aplicadas, po­­dem ser ferramentas importantíssimas na correção ou amainamento das desiguladades so­­ciais que estão aí. Cabe a nós trabalhar por isso.

É um absurdo, também, que a sociedade não seja informada acerca dos riscos que corre ao tomar contato com estes novos nanomateriais. Há muito que se fazer em termos de regulação e desenvolvimento do setor. Temos que usufruir das benesses que nos oferecem as nanotecnologias, mas devemos fazê-lo com sabedoria e parcimônia, e, especialmenmte, com responsabilidade.